sábado, 28 de abril de 2018

Amar é ter um pássaro pousado no dedo



Amar é ter um pássaro pousado no dedo

Como o toque de luz que desperta cores e formas
Tal o alvorecer que gentilmente delineia o mundo a minha volta
Assim é o abrir dos meus olhos ao te ver

Vejo-te, Azul-cinza, filha do mar e do oceano
Taumante e Electra lapidaram as tuas profundezas cerúleo
Convidaste-me ao teu recôndito e inundaste-me com teus encantos

Por desertos e campos, vales e montanhas
Nossos pés sempre juntos
Cada passo escrevendo na terra nossa história
No reflexo do límpido céu
No ressoar da brisa do mar
Na imensidão do espaço entre as estrelas e o luar
É a tua presença que sinto constante a me amar

Este amor, aprendemos juntos
Somente germina no solo fértil da liberdade
Amar não é possuir
Não se pode amar de verdade
Se amar só o que de mim há no outro

O amor só pode nascer quando o Outro aparece
Quando vejo os seus sonhos, seus desejos, a sua vida que não minha
Quando permito-me ver-te pelo o que és
Pelo o que estás sendo

Assim, o tempo nos ensinou a ver-nos
E juntos nos tornamos em quem somos agora
Escolhendo a cada dia amar e cultivar
A liberdade que nos define a cada instante
A nos alegrar ao ver as conquistas, o crescimento
O amadurecimento de cada um

Como diria, Rubem Alves: “Amar é ter um pássaro pousado no dedo”
Assim é o nosso amor
A amizade e o amor que construímos juntos
A cada olhar, gesto, palavra, lágrima e sorriso
O tempo nos aprimorou e tornou-nos melhores
Viver ao teu lado
E partilhar os detalhes que compõe a unicidade de nossas histórias
É a melhor escolha que algum dia fiz

A narrativa da nossa história no tecido do tempo
Ultrapassa qualquer distância que momentaneamente
Possamos experienciar

Como outrora havia escrito:

“A distância nos possibilita perceber sentidos
Nos traços que o tempo esculpiu em nosso ser
Suas linhas revelam conexões inauditas
Entre você e eu
O espaço entre nós não nos separa
Somente
Aumenta, reverbera
Ressoa, ecoa
O palpitar
E assim, aquele som
Que timidamente carregava
O teu e o meu tom
Nos envolve e nos preenche em ondas
Na tentativa de um suspiro nos afoga na Saudade
E com os pulmões cheios de versos
Ao abrir a boca toda palavra sai
Encharcada de amor”

E para mim é um privilégio te conhecer mais a cada dia
O tempo em tua pele esculpe uma obra prima
Na epiderme do corpo, imarcescível beleza
Corroeriam os olhos de invídia à deusa Afrodite
Na epiderme da alma sabedoria e destreza
Amalgamadas à ousadia e à força
Deixariam Atenas no oblívio

Ao teu lado, meus olhos testemunhas foram
Desta obra prima do tempo e do amor
Pois escolhestes partilhar tua vida ao meu lado
E por isso sou-lhe eternamente grato.
Pois, o maior mistério é a vida, o da vida é o amor
E tu, para mim, és ambas as coisas.


Libertas quae sera tamen

Libertas quae sera tamen 

Um sonho, ainda um sonho, de não "nivelar o outro" (como diria Kierkegaard) entre a "massa dos iguais", assim como de não rejeitar/desprezar o outro como indigno por não ser como eu - como penso, desejo, creio, imagino que "deveria" ser.

Um sonho em que a liberdade seria o chão comum da unidade (com-unidade), em que um não deixaria de ser quem é, e poderia mesmo assim estar-com um outro que também é.

Um sonho de liberdade, o terreno fértil em que germina o amor. Como diria Rorty - e que ouçam os inveterados "defensores da 'Verdade'" - "Cuidem da liberdade, que a verdade cuidará de si mesma".

Este é um sonho concreto, lembra-me de meus próprios versos...:

"Desadormeço do dogmático torpor
Pálpebras pesadas, excisadas pela angústia e dor
Desnudado de escusas, vulnerável ao amor e à vida
Insurreto do leito de morte das palavras vazias
Descalço, cônscio do humo na epiderme
Do gérmen dos passos no mundo de Hermes
Não ouso evadir o sonho concreto
Do outro e eu sob o mesmo teto
Do encontro na solidão
Do desespero rasgando a pele espessa da escravidão
Do toque de ásperas mãos
Tateando o corpo da libertação
Dos inaudíveis gemidos, daqueles não escolhidos
Perfurando os ouvidos ungidos e altivos
Da púrpura tinta nas páginas de histórias de glória
O sangue e suor daqueles, daquelas relegadas à memória".

Difícil esperançar por tal liberdade, em dias como estes, mas hoje é propício lembrar que mesmo tardando, vale a pena por ela lutar.

“Libertas quae sera tamen respexit inertem
Candidior postquam tondenti barba cadebat;
Respexit tamen et longo post tempore venit [...]" (Publius Vergilius Maro)
Trad:
"A liberdade que (é) tardia, contudo olhou (para mim) inerte
Depois que a barba caía mais branca de mim, que a cortava;
Olhou para mim, todavia, e veio depois de longo tempo [...]"

Libertas quae sera tamen - Liberdade ainda que tardia!