domingo, 18 de abril de 2021

Ah-Mor-de (Maçã) Doa-Amor

Ah-Mor-de

Maçã

Doa-amor

Eu, como as palavras.

Comi a crosta doce da palavra amor
Descobri o pseudofruto e seu sabor
Ah! mordi a maçã
Comi em partes meus frutos do amor
Entre as partes vi-me ali no vão

Comi as palavras
Mas não as incorporei
Comi-as para tritura-las
Para rasga-las
Assim fiquei

Não apenas desnudado
Fiquei em pedaços
Em frangalhos
De sentido, fiquei esvaziado

Entre o que é e o que foi
Ali no vazio do que digeri
Do que mordi e arranquei
Precisei criar, precisei devir

Surjo então neste vão
Ainda restam pedaços mas não
Sou nem o que resta
Nem o que abocanhei

Torno-me o fruto de minhas ações
Sem a crosta para me ocultar
Se quiser o fruto do amor provar
Preciso ser este amor, e a mim mesmo doar

Ah-Mor-de Maçã
Maçã Doa-amor
Eu como as minhas palavras.
Este verso, tem o meu sabor.

(Autoria: Kevin D S Leyser)

sábado, 17 de abril de 2021

O Prazer Demanda Tempo



“O Prazer Demanda Tempo.”

Os maiores deleites da vida estão nos momentos vividos plenamente, autenticamente. Estão nas minúcias, nos detalhes, nos encontros inesperados, não planejados, no espanto com o novo do óbvio. 

É preciso reencantarmo-nos com a vida que vivemos, desfrutar da nossa própria companhia, do encontro único e diário que temos com os que amamos, pois cada novo encontro é exatamente isso, NOVO. 

Desde cedo somos ensinados (programados) a viver focados em uma meta, um propósito, uma conquista de “ser alguém na vida”, “realizar um sonho ou plano” que supostamente nos definiria como alguém. 

Nada contra planos e sonhos, mas não é uma meta ou propósito que te definirá ou te realizará como “alguém”. Não é lá que vais finalmente te encontrar! ... pois, se em toda essa jornada você não vive sendo você, não é você que estará lá ou em qualquer suposta linha de chegada. 

A vida é realizada na jornada, em cada passo, cada manhã, cada dia e anoitecer, cada escolha, palavra, olhar, entre os turbilhões caóticos e profundezas tranquilas e avassaladoras de nossas emoções e relações diárias. É quando voltamos nosso olhar (e todos nossos sentidos) para a vida vivida que nos encontramos e passamos a desfrutar do prazer do processo constante de ser alguém. 

Pra ser demanda tempo. Prazer demanda tempo. Tempo vivido, gasto, investido e deleitado em viver intensamente, autenticamente cada instante da sua vida.

Como já disse o saudoso Rubem Alves:

“O prazer quer tempo. O prazer demanda tempo, então a gente tem que gastar tempo, porque a vida é pra isso, é pra gastar tempo. Quando a gente diz que está ganhando tempo, na realidade a gente não está ganhando tempo, a gente está estragando tempo.”

Perdemos o prazer na vida e em suas delicadezas, belezas profundas nas minúcias do sorriso demorado e verdadeiro, daquele abraço sem a pressa de sair, daquela conversa a dois em um encontro inesperado que vira café da tarde e janta, sem precisar olhar para o relógio, da atenção a voz, ao rosto, ao corpo, sem disputar espaço com os alertas do celular, do toque sem presa, o deslizar dos dedos, o silêncio repleto de segredos e mistérios revelados nos gestos, carícias e olhar...

Perdemos o prazer de encontros com nós mesmos, com o outro e com o mundo como fazíamos quando ganhávamos um disco de vinil novo da nossa banda favorita. Até o desembrulhar do plástico era delicado e apreciado, líamos todas as escritas impressas, deliciávamos todas as imagens e detalhes. Então ligávamos a vitrola, e com todo cuidado colocávamos lá o disco, bem devagarinho posicionávamos a agulha, e então, rapidamente sentávamos em um lugar bem aconchegante, normalmente no chão com travesseiros, e ali ficávamos (com a capa do vinil na mão) explodindo de expectativa, apreciando cada nota, cada som, até o final do lado A... seguindo maravilhados para o lado B... hoje, nossos encontros são parciais, fragmentados, o “fast forward” já está desde sempre programado...  e nós, de nós mesmos, do outro e do mundo, desde sempre alienados.

Pra ser demanda tempo. Prazer demanda tempo.

Invista tempo em você. Volte a ter prazer em viver.

 Kevin D. S. Leyser